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segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

George Schackle, o caleidoscópio e uma importante contribuição para a ESM.


George Lennox Sharman Shackle, economista keynesiano. Só isso já bastaria para fazer 99% da nova e rídicula direita brasileira torcer o nariz e nem ler o autor. A coisa muda de figura se fo acrescido a essa informação que o autor é um ultra-subjetivista, admirador (embora não utilizador frequente) do método praxeológico, céptico com a matematização excessiva da economia, e que transitou entre o núcleo duro da Escola Austríaca e da Escola Keynesiana. Seus trabalhos frequentemente citam Friedrich Auguste von Hayek, além de ter sido mentor de ninguém menos que Ludwigg Lachmann.

No meio de tamanha algazarra, como fechar os olhos para Schakle? Eu mesmo conheço pouco de sua obra, li apenas dois livros, o introdutório "Análise econômica ao alcance de todos" e o complexo, porém excelente, "Um esquema de teoria econômica". Ainda pretendo ler bastante do prolixo e genial autor inglês. Mas de suas duas obras, é possível extrair alguns conceitos muito úteis a uma nova proposta de Economia Social de Mercado. Como sabemos, a ESM se ampara, na sua corrente principal, em postulados neoclássicos; porém, como vimos em Röpke (artigo anterior a este), há um pé na Escola Austríaca que pode nos ligar a Schakle.

Neste artigo, mostrei que existe uma possibilidade de cooperação entre novos keynesianos e ordoliberais, e, como visto no já mencionado artigo sobre Ropke, que existe um alicerce comum na microeconomia que pode ser compatível com a EA? Então, qual autor pode juntar essas duas coisas? George Shackle. George, como carinhosamente o chamo a partir de hoje, em sua obra mais complexa supracitada, oferece poderosos argumentos contra as expectativas racionais que unem novos clássicos e neoclássicos, além de oferecer através da hipótese do caleidoscópio uma visão interessante sobre a possibilidade de surgimento de crises e na construção de políticas públicas que possam direcionar melhor e controlar melhor as variações de cores do caleidoscópio econômico.



Seu argumento contra as expectativas racionais mostra que mesmo que você conseguisse suprimir importantes dificuldades no momento de efetuar qualquer escolha no mercado, você ainda ignoraria uma série de fatores que podem influenciar nos preços e na sua decisão, e que, portanto, o conhecimento total sobre os fatores que influem na sua decisão é impossível. Argumentou ainda, de forma convincente, de que os mecanismos que geram equilíbrios no mercado tem menos a ver com leis de oferta e demanda num sentido clássico e neoclássico, e sim com os medos e preocupações reais dos indivíduos, que em períodos de crise, se tornam mais conservadores em suas relações econômicas. Assim, Schakle (1969, p.59-60) demonstra que os mecanismos que geram a crise (desequilíbrio) são os mesmos que geram equilíbrio.

"Há um brinquedo chamado caleidoscópio no qual três espelhos voltados para dentro e montado como pirâmide repetem em reflexões simétricas, o fortuito mosaico de cor formado pelos fragmentos de vidro colorido espalhados na base do instrumento. Esse brinquedo parece estranhamente adequado a representar uma analogia do método de Keynes. [...] Um simples movimento de mão, uma vaga "notícia", podem fragmentar uma composição e substituí-la por outra totalmente diferente."
Uma junção de análise psicológica real e teoria do caos, mostram que é papel do Estado criar condições institucionais que tornem essas mudanças menos bruscas e controladas, além de demonstrar que há um comportamento de manada no mercado que ao menor erro de um player grande do mercado, se instaura a crise. Shackle, portanto, é um autor que merece ser melhor estudado, pois é capaz de fazer uma sólida ligação entre a macroeconomia e a microeconomia da incerteza.