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sábado, 9 de maio de 2015

De Eucken para Marx: Você entendeu tudo errado!


As mais famosas refutações à obra de Karl Marx (1818-1883) ou ainda, a ideia geral de socialismo, são sem sombras de dúvidas as obras de Eugen von Böhm-Bawerk (1851-1914), "A teoria da exploração do socialismo-comunismo" e a obra "Socialismo" de Ludwig von Mises (1881-1973), ambos pertencentes a Escola Austríaca de Economia. Porém, outras obras surgiram questionando o marxismo ou o socialismo enquanto ideia prática, poderia citar o filósofo Sir Karl Popper (1902-1994) em relação à fundamentação historicista do marxismo, no seu clássico "A miséria do historicismo" ou o próprio economista neoclássico Lionel Robbins (1898-1984), que em "Teoria da Política Econômica" usa argumentos clássicos da escola de Manchester (baseados em Adam Smith, J.S. Mill e David Ricardo) para questionar o socialismo como ideia prática. Todavia, não obstante todas essas críticas serem excelentes e bem fundamentadas, gostaria de mostrar como a Escola de Freiburg e os ordoliberais contribuíram para desmascarar a maior falácia político-econômica já inventada. Em seu magnum opus, "Fundamentos da Política Económica", o economista alemão Walter Eucken (1891-1950) aponta um erro brutal na interpretação marxista do capitalismo laissez faire. É importante dizer que Eucken não era um defensor do laissez faire, mas que não obstante esse fato, ele percebeu na crítica marxista um erro crasso, onde o filósofo alemão aplica uma lógica que se aplica a um tipo específico de mercado a todo o capitalismo independente das inúmeras formas de mercado que ele poderia se apresentar, a depender das organizações políticas e institucionais.

Walter Eucken - Fonte: VEJA
Marx, em sua obra em três volume, "O Capital", pontua que todo lucro advém da mais-valia; isto é, de um período de tempo que o trabalhador labuta sem remuneração, e que é apropriado pelo patrão. Para o prussiano de Tréveris, essa era a razão pela qual os burgueses tornavam-se cada vez mais ricos e os proletários cada vez mais miseráveis. Ou seja, para Marx, a conditio sine qua non para a existência do lucro é a exploração do mais pobres que não têm alternativas a não ser vender sua força de trabalho ao burguês sem coração, que movido pelo interesse do lucro, se cega aos sofrimentos humanos e às lamúrias do proletariado em favor de sua ideologia de classe.
Karl Marx em sua obra demonstra que o proletariado estava cada vez mais pobre em relação à burguesia, ele em suas obras aponta dados referentes a Inglaterra e a Alemanha; tais dados ainda podem ser encontrados e confirmados pela historiografia. Por exemplo, o historiador da economia Jacques Brasseul, em "História Econômica do Mundo - Das origens aos subprimes" traz na página 129 dados bastante evidentes desse empobrecimento do proletariado entre os anos de 1750 e 1810. Em 1750, os trabalhadores ingleses ganhavam apenas 42% do que viriam a ganhar em 1900, em 1770 ganhavam apenas 38% em 1810 ganhava ainda menos, míseros 33%! Em contraposição, a burguesia estava cada vez mais rica!

Eucken demonstra que o raciocínio marxista não está amparado na realidade, e toma o particular pelo todo. De fato, a tal exploração existia, mas essa exploração não representava a essência do capitalismo e sim uma forma peculiar de mercado. E também que a exploração ocorrida nesse período não correspondia às explicações - um tanto metafísicas, por sinal - que Marx dava a ela.
O que ocorreu no período, foi a junção de um grupo de fatores que depois nunca mais viria a acontecer generalizadamente, apenas em situações pontuais em um país ou outro. A ascensão do modelo industrial baseado na produção em massa, ocorreu, como era de se esperar, num momento histórico em que a sociedade estava fundamentada na produção artesanal e agrícola de pequena escala. Uma sociedade majoritariamente acostumada com o trato da terra e com uma forma de trabalho menos sofisticada tecnicamente. Quando a produção em massa surge, imediatamente a produção artesanal se torna cara, menos eficiente, atrasada e é, por fim, superada pelo modelo fabril.

"Con la industrialización perdieron muchos trabajadores la propiedad de los medios de producción con que trabajaban y que poseían en explotaciones artesanas o agrarias, o en la economia individual. Se estabeleció una disociación entre economia domestica y empresa, que en la pequena explotacion y en la economia individual se encuentran unidas. Desde luego esta disposición ha existido en la historia bajo multiples formas. Pero entonces dominaba entreramente." (Eucken, 1956, p.79)

Como toda e qualquer inovação técnica nunca surge em quantidades massivas, mas sim em experimentos localizados e acessíveis a poucas pessoas, assim também surge a produção industrial, nas mãos de poucos que detinham recursos financeiros para investir em maquinários.  Para ser exato, o capitalismo liberal já começou monopolizado, através da quebra de um sistema mercantilista - e também - pelo fato de que a própria inovação tecnológica sempre surge em experimentos individuais e tendem a se tornar populares depois de decorrido um período de tempo. Walter Eucken observou isso e, checando dados percebeu que o enorme contingente de pessoas que perderam suas ocupações tradicionais e não tinham qualquer outro nível de instrução, a qual deveriam recorrer para uma ocupação alternativa, só poderiam subsistir pelo trabalho braçal. E somente a recém nascida indústria de produção em massa poderia acolher essa mão-de-obra sobressaliente.

Ora, se em uma situação em que existem oligopólios ou monopólios na oferta necessitando de mão-de-obra, e simultaneamente, uma larga quantidade de pessoas disposta a vender sua força de trabalho sem alternativas a não ser esses poucos compradores, obviamente estamos num caso de monopsônio, ou, como diz Eucken (1956, p.78): Monopólio de demanda. Para piorar, isso estava concentrado no mercado de trabalho, onde havia um número enorme de vendedores de força de trabalho, mas poucos - quando não apenas um - comprador dessa força de trabalho. Nesse caso, o trabalhador não tem outra escolha, senão aceitar salários cada vez menores para não ir parar na sarjeta. Eucken na mesma página explica:

"Qué es lo que existia en realidad? Un monopolio de demanda en un mercado de trabajo. Era algo que entonces estaba muy extendido. En él, el salário puede ser reducido por el patrono hasta un limite indeterminado, y los trabajadores reciben una participación en el producto social que es mucho menor que si existiese también concurrencia por parte de el patrono, que hubiese equilibrado los salarios".

A exploração vista por Marx de fato existia, mas ele havia diagnosticado errado não apenas a causa dessa exploração, mas também a sua natureza. 

"La situación de miseria de los trabajadores, que Marx describió correcta e insitentemente, también fue explicada incorrectamente por él." El análisis falla en un punto decisivo de su sistema, al ignorar las formas de mercado." (Eucken, 1956, p.80)
Com o passar do tempo as inovações tecnológicas na oferta foram se popularizando e novas fábricas foram sendo aberta, e com isso novos "compradores de força de trabalho" foram aparecendo. As opções aumentavam e a exploração não era mais a única alternativa. Como consequência disso, os salários começaram a crescer. Brasseul (2010, p.129) mostra que em 1820 os salários começam a subir - 42% naquela ano em relação a 1900 -, em 1850 já estavam a 60% do valor que viriam atingir em 1900 e, por fim, em 1910, já registrava 2% de crescimento, superando nessa margem o salário de 1900.
Eucken (1956, p.78) em sua obra avalia a realidade desse monopsônio na própria Alemanha, onde ele aponta que em toda a Silesia (região na fronteira entre a Polônia e a Alemanha que pertencia a antiga Prússia) não havia mais do que um tear de algodão. Em resumidas contas... 

...Na desconhecida Batalha entre Marx e Eucken - batalha esta nunca travada, mas que podemos chocar as ideias de ambos em relação a interpretação do capitalismo, ainda que posteriormente - Eucken indiscutivelmente leva a melhor. Essa pode ser considerada, com toda a certeza, a contribuição da Escola de Freiburg no desmascaramento do socialismo. Flagelo ainda vivo e que tenta todos os dias se apossar da América Latina.

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BRASSEUL, Jacques. História Econômica do Mundo - Das origens aos subprimes. Lisboa: Edições texto e grafia, 2010.

EUCKEN, Walter. Fundamentos de Política Económica. Madrid: Rialp S.A, 1956.

2 comentários:

  1. Ótimo! É sempre bom ver opiniões diferentes. Uns ignoram a miséria vista por muitos naquela época, enquanto outros a levam em conta mas a diagnosticam de forma ilógica.

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