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segunda-feira, 18 de julho de 2016

Minsky contra a Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos

Tradução de Hugo Rossi de um artigo do Social Democracy on 21st century (obs).

Duas postagens aqui tentaram conectar a hipótese da instabilidade financeira de Minsky e a Teoria austríaca dos ciclos econômicos nos termos de suas visões de crédito e ciclos econômicos:
Enquanto ambos se preocuparam em desestabilizar o papel do crédito monetário endógeno, eu permaneço cético com as tentativas de os conectarem.
A teoria Austríaca dos ciclos econômicos é uma teoria do equilíbrio cuja preocupação reside nas (supostas) distorções reais no setor de bens de capital da economia causada pelo desvio da taxa bancária de interesse a partir de uma imaginária taxa de juros natural wickselliana. A teoria também requer premissas irreais sobre a natureza do capital. Primeiramente, é questionável se a maioria dos bens de capital podem ser categorizados de forma útil em “ordens” maiores ou menores, e, segundamente, capital heterogêneo também pode ter um grau significante de durabilidade e substituibilidade. A estrutura do capital em uma economia capitalista, onde achamos alguns importantes graus de adaptabilidade, versatilidade e durabilidade na natureza dos bens de capital, dá a entender que a fase de “estouro” da Teoria Austríaca dos ciclos econômicos é uma explicação grosseira e pouco convincente para qualquer contração no mundo real.
Além disso, a Teoria Austríaca dos ciclos econômicos é dependente de uma tendência de equilíbrio pela qual a taxa de desconto bancário vai retornar para a imaginaria taxa de juros natural, e assim limpar o real mercado de bens de capital. Todas essas coisas são apenas desnecessárias teorizações sobre o equilíbrio, irrelevantes para o mundo real.
Mas o que é ainda pior é que a Teoria Austríaca dos ciclos econômicos tem pouca preocupação com as crises financeiras ou bolhas de ativos, o fenômeno econômico do mundo real associado com sistemas financeiros pouco regulados.
Diferentemente disto, a teoria de Minsky presta atenção tanto às crises financeiras quantos às bolhas de ativos e é uma teoria superior, sem sombras de dúvida. Apesar de alguma influência das teorias do equilíbrio de Schumpeter, a hipótese da instabilidade financeira de Minsky não exige realmente suposições ou efeitos de equilíbrio geral.
Karen I. Vaughn identificou a maior falha da moderna teoria Austríaca a este respeito: “Mises nunca discute a possibilidade de erros especulativos sistêmicos, exceto no contexto de sua teoria dos ciclos econômicos, na qual especuladores e investidores são enganados por sinais monetários impróprios emanando de uma reserva fracionaria bancária. No entanto, se o futuro não pode ser previsto, ou como Schakle diria, se “o futuro é criado a partir das ações do passado”, por que isto não é ao menos possível de se conceber para atividades especulativas que estão incorretas em "rede" ao menos por algum tempo? Certamente, nós temos a evidência empírica de bolhas especulativas que são endógenas para os mercados como na hipótese da instabilidade financeira. Alguém poderia pensar que o alcance e potencial dos fatores limitantes que afetam tais instabilidades endógenas seriam de grande importância para o completo entendimento das ordens de mercado, mesmo assim é um problema surpreendentemente omisso na literatura Austríaca. Por isso, embora possamos apreciar a força do argumento de Mises até certo ponto, parece que uma parte crucial da defesa de um funcionamento efetivo da economia de mercado está faltando.” (Vaughn. 1994: 87-88).
Finalmente, acredito que a declaração de Finegold Catalán é de valor inestimável:
“Pelo que entendo, a posição de Misnky é que o ciclo do crédito garante seu próprio sustento, a medida que a expansão continua do crédito é necessária para maximizar o lucro. Maior expansão do crédito implica em queda dos padrões de crédito, por sua vez, aumentando o risco da carteira de crédito dos bancos. Em uma perspectiva macroeconômica, quanto maior a expansão do crédito, maior o risco de um choque financeiro. O sistema bancário não pode se auto regular, pois não há incentivo para o ser, e, portanto, o governo precisa regular a industria de forma que ela atinja uma quantidade de risco ótima.
Não considero essa teoria, ao menos exposta desta maneira, muito convincente. Primeiramente, não é claro porque risco crescente (e.g. uma crescente probabilidade de perder) não age como um incentivo para restringir uma carteira de empréstimos. Segundo, empiricamente, há pouca evidência que bancos ignoram os riscos.”.
O que? Realmente há “pouca evidência que bancos ignoram os riscos” na mais recente bolha imobiliária? Só posso concluir que o empréstimo mentiroso e empréstimos NINJA (do inglês, sem renda, emprego ou ativos) escorregaram da sua mente.
Quanto ao “crescimento do risco (e.g. um crescimento da probabilidade de perda)” agindo como “um incentivo para restringir a carteira de empréstimo”, alguém pode se perguntar porque em numerosas crises financeiras na história os bancos carregaram ativos podres ou jogaram fora empréstimos para especuladores sem muito interesse em restringir suas carteiras de empréstimo. A bolha imobiliária da Austrália em 1880 imediatamente vem à cabeça.

BIBLIOGRAFIA
Vaughn, K. I. 1994.
 Austrian Economics in America: The Migration of a Tradition. Cambridge University Press, Cambridge and New York.
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OBS:
Este não é um blog de esquerda ou social-democrata, mas acreditamos que ambos os lados do espectro possuem ideias que estão correctas ao menos em parte, por isso, por questão de honestidade intelectual, este blogue compartilha alguns textos mesmo que partam de lados distintos do espectro político.

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