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domingo, 29 de novembro de 2015

Você como PIB sim! – Parte dois.


Uma pessoa que é muito especial para mim, me perguntou esses dias o porquê dos alimentos estarem tão caros, e me citou o caso do açúcar que na região dela, num curto período de tempo subiu seu valor na bagatela de três reais. Inspirado pela pergunta dela, decidi fazer uma segunda versão do artigo "Você come PIB sim!".

Para analisar o conjunto da obra devidamente, precisaríamos de dois artigos desse, mas vamos aos efeitos primários sobre o preço. Ou seja, aqueles que são mais imediatos antes de entrarmos nas divagações macroeconômicas que muito me alegram.

O leitor cristão deve estar familiarizado com a história de José, hebreu que se tornou governador no Egito. José após sete anos de bonança estocou alimentos para os sete tenebrosos anos de seca e fome que se abateriam sobre as terras do Egito. A medida tomada por José garantiu a sobrevivência dos egípcios e dos hebreus nesse período. Nosso governo, bem como o egípcio viveu anos de bonança, mas não fez a lição de casa como José.

Embora não falte comida para as pessoas, a disponibilidade dos alimentos ficou menor e, portanto, mais caro comprar a cesta básica. Seca, combustível e câmbio são os fatores determinantes desse encarecimento. Parte da culpa é da natureza, mas não podemos eximir o governo de culpa também.
Primeiro de tudo. É ano de El Niño, o que produz pouca chuva nas regiões sudeste, parte do centro-oeste e no nordeste onde o cultivo da cana-de-açúcar é maior que no sul e no norte. Com isso, há menos água a disposição para as plantações e o plantio da cana-de-açúcar consome muito mais agua que o Eucalipto, por exemplo. Um verdadeiro bebedor! Com menos água a disposição de uma cultura tão necessitada deste elemento, o desenvolvimento do plantio não segue seu curso ótimo. Com isso a oferta de açúcar cai substancialmente. Quando a oferta cai, porém a demanda mantem-se inalterada, os preços sobem.

Com a diminuição da oferta de cana-de-açúcar a indústria do etanol passa a competir por esse recurso escasso na produção de combustível, some-se a isso o encarecimento da gasolina devido aos inúmeros impostos colocados sobre ela, além do reajuste natural dos preços depois de um congelamento improfícuo feito pelo governo. Ou seja, como a gasolina está cara, as pessoas (que desde 2005 compraram preferencialmente os carros flex, que usam tanto gasolina quanto álcool) escolhem o álcool que também está mais caro. Ou seja, sobe-se a demanda por um produto que, embora caro, ainda está mais barato que a gasolina. O aumento da demanda pelo etanol encarece ainda mais os derivados da cana-de-açúcar.

Gasolina, óleo diesel e etanol mais caro encarecem também o transporte rodoviário. Com isso o frete sobe e, com isso, os preços administrados ao consumidor também. Outro fator que encarece é de ordem macroeconômica, o câmbio. Com o câmbio desvalorizado (o dólar pode comprar hoje quase quatro reais), adubos e pesticidas que são importados ficam mais caros, com isso, para compensar a diferença o produtor adiciona o desnível ao preço. Outro fator que encarece a produção é a energia elétrica. Como a demanda por eletricidade é majoritariamente inelástica, de forma que alterações no preço não provocam reduções substanciais de consumo, a tendência é que o consumo siga mais ou menos estável na cadeia produtiva provocando o encarecimento do custo de produção. Com a produção ficando mais cara, é claro que o produtor descontará a diferença nos preços administrados ao consumidor.

Mesmo o feijão ou o café sofrem influências. A produção das embalagens são feitas com compostos plásticos oriundos do petróleo que como mencionei acima se tornaram mais caros. E para a sua produção demanda-se energia elétrica, que se tornando mais cara, agrega custo ao produto. O maquinário responsável pela produção das embalagens, por exemplo, também possui peças fabricadas no exterior, que para serem compradas ou reparadas demandam a conversão do real em dólar que está hoje num cenário desfavorável. Desde 1999 com a adoção do tripé macroeconômico, a economia brasileira prosperou bem até meados de 2009, que com a crise dos Estados Unidos, fez com que o governo usasse esse evento como desculpa para inserir uma nova matriz econômica baseado em aumento de gasto público, juros baixos e concessão de crédito e políticas públicas voltadas para estimular o consumo, como o caso do programa Minha Casa Melhor.

Essa alteração fez com que dinheiro novo inundasse o mercado empurrando a inflação para cima, o governo para evitar que a inflação passasse o teto da meta, começou a controlar o câmbio com mais constância, e ainda aumentou o gasto público em programas como o PAC. Os resultados foram apenas de curto prazo. Em 2010 o governo registrou um crescimento de 7,5% do PIB. Ilusão que serviu de gritaria governista.

Primeiro, porque em 2009 o governo veio de uma base muito baixa, uma retração de 0,3% do PIB provocada pela crise de 2008. A crise representou apenas um contratempo no comércio mundial, entretanto como o capital físico e a infraestrutura já existiam, ficou fácil retomar o crescimento no ano seguinte. Contudo, em 2011 a desilusão veio. O PIB crescera apenas 2,6%, o governo encarou como se fosse normal um crescimento abaixo de 3% se ignorarmos a recessão de 2008, algo que não se repetia desde 2002, quando o governo ainda enfrentava a “crise Lula” e os estilhaços da recente crise Argentina.

Em 2012 o cenário se deteriorou mais ainda, o PIB cresceu apenas 0,9%. Segundo Marco Antonio Villa em “Década Perdida”, o crescimento foi apelidado pela oposição de PIBinho. A situação em 2013 melhorou um pouco com os sinais de recuperação da Zona do Euro, novamente o PIB fecharia na casa dos 2%, contudo por pouco tempo. As “Jornadas de Junho” derrubaram a popularidade da presidente, instaurou um clima de desconfiança política no país. A China desacelerava substancialmente seu crescimento e passava a reduzir drasticamente sua compra de commoditties brasileiras. O intervencionismo, a corrupção e a política de monopolização artificial de mercado (política de campeões nacionais) retiraram o restante de confiança na economia brasileira. O resultado? O PIB encolheu novamente, 0,1% em 2014.


E por fim, chegamos a 2015, onde o governo luta com o congresso para passar um ajuste fiscal que seja mais complexo do que a simples subida de impostos feita no desespero pelo ministro Joaquim Levy. Em suma, os anos de bonança passaram e diferentemente de José, o governo nada fez. Desde de 2014 ingressamos na era das vacas magras e as previsões mais otimistas para sairmos dela estão nos distantes 2017 e 2018. Em 2015 o resultado a economia está selado: Queda de 3,5% no PIB. Isso significa menos bens e serviços em circulação e com inflação alta! Tal cenário é conhecido como estagflação. Eis onde estamos.

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