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terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Socialismo: um mundo paralisado.


Ludwig Von Mises, economista austríaco, escreveu que uma economia socialista era totalmente impossível, pois quando tudo fosse estado, seria impossível definir preços. E sendo impossível definir preços, não seria possível planejar a economia, que é a ideia central do socialismo. Sendo assim, uma sociedade que fizesse isso acabaria por ver todas as suas atividades industriais e até mesmo os trabalhos mais simples paralisarem. Quem prova isso é o economista russo Boris¹ Brutzkus², que relata que os pescadores na Rússia socialista não conseguiam pescar seus peixes, porque não conseguiam comprar as redes que precisavam, e não conseguiam comprar as redes, porque os fabricantes não conseguiam comprar o material que as compõe, e estes não eram fabricados, porque os produtores não sabiam o custo do processo de fabricação e nem mesmo dos meios de produção. Para corrigir esse problema, Lênin precisou construir um simulacro de mercado, dando autonomia a empresas publicas a funcionarem como autarquias ou cooperativas, além de aceitar a existência pequenas propriedades privadas (NEP).
Mas não é apenas a paralisação econômica que ocorre dentro do socialismo tal como proposto originalmente por Marx. A sociedade como um todo também acaba estagnando, e por conta disso, revela o que tem de pior no ser humano, seus vícios no lugar de suas virtudes.
Apesar de não ser grande fã de Ayn Rand, a filósofa russa exilada nos EUA, me parece correta no que diz em sua distopia “A revolta de Atlas”; o socialismo por eliminar o mérito individual em favor da classe, elimina também a criatividade e a produtividade. O próprio Norberto Bobbio observa isto, ao ver que os liberais dão preferência à liberdade, ao passo que os socialistas dão preferência a igualdade. Como nem todos os homens são gênios e acima da “média” (palavra que já dá a entender o que vou dizer), o igualitarismo do socialismo tem o inevitável efeito de levar todos a um patamar de igualdade antropológica, podando os mais criativos, inteligentes e sábios em favor dos comuns, ou da “média”.

Quem também nos trás uma constatação similar é o filósofo brasileiro Luiz Felipe Pondé em “Guia politicamente incorreto da filosofia”; nas páginas 41 e 42, ele nos diz:
Na minha vida já tive a (infeliz) oportunidade de participar de várias reuniões na universidade, seja como aluno, seja como professor, nas quais estavam presentes muitas pessoas “preocupadas com o coletivo e a igualdade”, e nunca vi tamanha concentração de pensamento a serviço de tanta estupidez e nulidade. Como dizia Tocqueville no século 19, autor do maior livro sobre democracia já escrito, Democracia na América, a igualdade ama a mediocridade. Rand acerta em cheio quando mostra que uma sociedade que só fala no “bem comum” e na “igualdade entre as pessoas” contra as diferenças naturais de virtudes entre elas, está a serviço do mau-caratismo, da preguiça e da nulidade. Ao buscar destruir as “injustiças sociais”, o mundo descrito por Rand destrói a produtividade, fonte de toda a vida, paralisando o mundo.
Não são apenas estes dois filósofos separados no tempo e no espaço que observam isto, o papa Leão XIII, na magnífica encíclica “Rerum Novarum” de 1891, que viria a ser uma das bases da democracia cristã, o pontífice diz:
3. Os Socialistas, para curar este mal, instigam nos pobres o ódio invejoso contra os que possuem, e pretendem que toda a propriedade de bens particulares deve ser suprimida, que os bens dum indivíduo qualquer devem ser comuns a todos, e que a sua administração deve voltar para - os Municípios ou para o Estado.”
O papa estava correto. O socialismo foi no final das contas o império dos vícios civis, ao contrário do mundo perfeito que se prometia. E quando digo isso não me refiro apenas aos crimes de estado e aos genocídios. Eles também contam, mas não estão presentes no cerne do que ao que eu quero me referir aqui.

Mas antes de irmos a fatos históricos retorno a Luiz Felipe Pondé que na mesma página comenta outra vez sobre a detestável, porém aqui correta, Ayn Rand, desta vez relacionando ao politicamente correto, que na prática é uma forma de "socializar" a moral:

A distopia descrita por Rand é a melhor imagem do mundo dominado pelo politicamente correto: inveja, mentira, pobreza, destruição do pensamento, tudo regado pelo falso amor pela humanidade.”

Assim como os socialistas, que prometendo um mundo mais amoroso e menos opressivo, criaram o maior sistema de opressão e corrupção já visto sob a face da terra.
Em “Du passé faisons table rase!”, Martin Laar historiador e ex-primeiro ministro da Estônia nos conta nas páginas 279 e 280 que em seu país, os jovens a partir da década de 80 já não entravam mais no PCE por conta de ideais elevados, ele nos traz uma nova perspectiva da adesão partidária.
“No início dos anos 80, toda ilusão já havia se dissipado acerca dos comunistas e do partido comunista. Era difícil encontrar pessoas que acreditassem realmente nos ideais comunistas. [...] Uma outra ilusão também desaparecera, a de que era possível renovar o partido e o sistema soviético a partir de seu interior. Daquele momento em diante, entrava-se no partido exclusivamente por motivações de interesse e de carreira pessoais, mas os ideais comunistas eram desprezados, ironizados.”
O que Laar descreve na Estônia, não foi um fenômeno isolado, na RDA, isto levaria provas claras do congelamento de qualquer governabilidade ou de mobilidade interna do partido. Kotkin e Gross em “Sociedade Incivil” são os que mais observam as causas do fim do regime, e uma das causas da queda do comunismo foi a estagnação da sociedade provocada pelos vícios dos apparatchiks dentro do Partido; entre eles a corrupção, o nepotismo e o fisiologismo.
“Mas, apesar de suas melhores qualificações (em relação a seus pais), os critérios políticos continuavam supremos para o avanço profissional. Resumindo, o estado alemão oriental estava tão repleto de incompetência, corrupção e informalidade quanto qualquer outro estado comunista.” (p.96)
Na página seguinte Kotkin continua:
“A sociedade Incivil da RDA ficou imobilizada por seu próprio avanço. Em 1989, Honecker, que tinha iniciado sua carreira no partido como um jovem agitador da aliança, tinha 77 anos. Willi Stoph (1914-99), primeiro-ministro da Alemanha Oriental desde 1964 (a não ser por um breve interlúdio quando foi chefe de Estado), tinha 75. Erich Mielke (1907-2000), chefe do Stasi desde 1957, tinha 81.”
O Politburo congelou na Alemanha Oriental, tamanha era a corrupção e o fisiologismo dentro do partido.
Em alguns países, o nepotismo era marca principal do funcionamento da “Sociedade Incivil”, Kotkin e Gross (p.126) nos dão o exemplo da Romênia de Ceausescu, onde Elena, a “primeira dama” que sabidamente não tinha nem mesmo o ensino primário, agora tinha subitamente um doutorado em química! Além de Micu Ceausescu, filho do comandante que ocupava a importante posição de ministro da juventude. Tudo isto claro, graças ao tráfico de influências dentro da estrutura do partido-estado.
A jornalista Barbara Demick em “Nada a Invejar – Vidas comuns na Coréia do Norte”, nos conta não apenas muito sobre o pacato povo norte-coreano, mas como também fala sobre a família que manda no país desde sua fundação. A estrutura do estado funciona como uma monarquia hereditária absoluta, passando de pai para filho, de Kim Il Sung, para Kim Jong-il e por fim, Kim Jong-un; membros da família ocupam cargos importantes no partido-estado, como o próprio tio que Kim Jong-un mandou matar.
Kotkin nas páginas 43, 44 e 45 faz tão completa descrição do congelamento da sociedade, que só me resta finalizar este artigo com estas citações diretas.
De fato, o paradoxo da sociedade incivil é que seus membros tinham autoridade e comando ilimitado sobre quase todos os recursos nacionais, porém estavam paralisados. Os establishments que podiam coletivizar os camponeses e nacionalizar um país inteiro viam-se posteriormente incapazes de adotar as menores ações corretivas quando algo não funcionava conforme o plano.”
“A incompetência nos sistemas comunistas era, portanto, estrutural. Para afastar qualquer possível ameaça de serem depostos e para aumentar os laços de dependência, os dirigentes frequentemente preferiam nomear os menos capazes como seus subordinados diretos, algo que se repetia ao longo de toda a hierarquia. Mesmo os de dentro lamentavam a tacanhez e submissão dos que ascendiam no sistema. As pessoas com iniciativa, raciocínio independente e integridade, que tinham se ligado ao partido para levarem vidas politicamente ativas ou para melhorar seus países, eram geralmente eliminadas ou esmagadas. [...] A apropriação indébita tornou-se um modo de vida num sistema em que a propriedade era teoricamente pública, embora, na verdade, estivesse à disposição privada de administradores e dirigentes.”
“Pior que isso, o que Vilfredo Pareto havia observado mordazmente na virada do século, acerca das elites em geral – que as classes dirigeantes (classes dirigentes) transformaram-se em classes digerantes (classes digestivas), fixadas no consumo e autopreservação -, nos sistemas comunistas provou-se hostil à correção. Esta falta de flexibilidade estrutural acrescia-se de uma deficiência nas ferramentas de administração de conflitos.”
Não há dúvidas de que Rand, Pondé e Leão XIII foram certeiros. Os regimes comunistas se converteram nos impérios dos vícios. E para finalizar, fica claro que isto corrompeu a sociedade inteira, principalmente quando você após ver o que ocorria no topo da “cadeia alimentar socialista”, decide parar para observar a sociedade como um todo. Mihai Dorobantu, um romeno que viveu o comunismo na pele, concedeu-me uma entrevista neste blog que vocês podem acessar aqui.
Ele mostra como uma pessoa por pura inveja ou em troca de favores com o estado, poderia denunciar outras pessoas que, muitas vezes eram inocentes. Mostra também que para  conseguir um pouco mais de comida, às vezes era necessário subornar um fiscal ou agente de estado. Penso que, contra fatos, os argumentos em contrário apenas servem de alegoria natalina, fazem a alegria durante a véspera de natal. Mas no outro dia você sabe que o presente da árvore não veio de nenhum Papai Noel e sim de alguém da sua família.
Por fim, podemos ainda citar a excelente obra "A bandeira vermelha: história do comunismo" de David Priesteland, onde ele mostra que mesmo na URSS, sede do modelo de comunismo e provavelmente a mais rica e poderosa nação comunista, a sociedade se converteu em uma sociedade baseada no compadrio, como ele diz na página 206 de sua obra:
"Muitos chefes locais, que haviam conquistado alto status por sua atuação na guerra civil, comportavam-se como "pequenos Stálin", com suas próprias próprias redes de apadrinhamento - os chamados "rabos" - que arrastavam atrás de si quando transferidos de um posto para o outro."
Ronald Reagan não poderia estar mais certo quando chamou a URSS de "Império do Mal".

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