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quarta-feira, 22 de julho de 2015

Nacionalismo, desenvolvimentismo e degeneração cultural por Wilhelm Röpke.


Wilhelm Röpke (1899 - 1966) foi um historiador, filósofo e economista alemão, influenciado simultaneamente pela escola austríaca e pela escola de Freiburg, Röpke tornou-se um dos mentores do pensamento ordoliberal sendo de grande influência sobre Ludwig Erhard.

Wilhelm Röpke
Num pequeno livro chamado "Os países subdesenvolvidos" publicado no Brasil pela editora Saraiva, no ano de 1963, Röpke faz uma análise metódica sobre como o nacional-desenvolvimentismo é um maleficio para os países, não apenas em nível econômico, mas também social e político. Quando o alemão escreveu este livro passávamos por um período marcado pelo estatismo keynesiano desenfreado das décadas de 50 e 60, onde toda política econômica era baseada em inflação, e que tensões políticas oriundas do medo do comunismo incentivavam as bolhas de crescimento artificial. Röpke percebeu que isto, ao contrário de prevenir o avanço do comunismo, pelo contrário, o estimulava.
intelligentsia da época argumentava que o comunismo era um fenômeno de países pobres e que portanto, tirar estes países do subdesenvolvimento era essencial, o que Röpke também concordava, porém, divergia dos economistas do seu tempo em como. Durante os famosos acordos de Bretton-Woods, ficou acertado que as nações desenvolvidas ajudariam as subdesenvolvidas a alcançar o desenvolvimento através da criação de fundos internacionais, bancos específicos para nações, onde os países ricos, em especial, os Estados Unidos,  emprestariam altas somas em dinheiro para as nações pobres financiarem seu programa de desenvolvimento.

Uma ideia aparentemente boa, porém Röpke fez sérias objeções a ela. Na opinião do "filósofo-economista", tal ideia na verdade reforçava ranços ideológicos das ex-colônias com suas ex-metrópoles, haja visto de que esses países culpam os desenvolvidos pela sua pobreza e se sentem no dever moral de cobrar delas um auxílio ao seu desenvolvimento. Outro problema, na visão de Röpke, era o dinheiro ser entregue aos Estados, que escolheriam os campeões nacionais, com isso, insuflando o corporativismo e fortalecendo politicamente grupos nacionalistas, que após o fim do fascismo e a queda do nazismo, acabaram se encontrando ideologicamente mais próximos dos socialistas e comunistas. Por exemplo, aqui no Brasil, temos o caso de João Goulart, presidente brasileiro deposto pelo levante militar de 64, que era descendente do getulismo, e que procurou apoio nos socialistas e comunistas, situação a qual viria a desembocar na crise institucional que o levou à sua deposição.

Röpke ainda enfatiza que essas políticas criam ainda mais ranços ideológicos com os países desenvolvidos, uma vez que os fundos monetários e bancos internacionais não passam de extensões do poder econômico das nações ricas, com isso, quando esses países pobres acabarem por enfrentar alguma crise, terminarão afogadas em dívidas enormes com os países ricos, situação que servirá de pretexto para mais uma vez, culpá-los como os causadores de sua desgraça. Röpke foi profético nisto. A crise do petróleo revelou a fragilidade de países como o Brasil, que passou a sofrer com hiperinflação e altíssimo grau de desigualdade social, isto reforçou os discursos nacionalistas e de esquerda ao fim do regime militar.

Outro ponto levantado pelo economista ordoliberal é a questão cultural, o desenvolvimento técnico do ocidente é resultado de sua cosmovisão judaico-cristã e iluminista, que permitiu o avanço da ciência e da tecnologia, impulsionando assim o desenvolvimento social e econômico. Entretanto, as nações não-ocidentais, invejando alcançar este mesmo patamar de desenvolvimento técnico e social, se vêem forçadas a abrir mão de seus valores e tradições. Wilhelm reconhece que a cultura é um substrato maleável e que a modificação da mesma é inevitável, mas reitera que a modificação dela deve ser gradual e voluntária, pois a modificação brusca do modo de vida destes países pode criar caos social e ter impactos negativos que serão carregados por toda a posteridade. Röpke apenas percebeu o óbvio, o homo faber não é um ser diferente e separado do homo sapiens.

A crítica de Röpke ao conceber isto se dirige novamente aos desenvolvimentistas, pois para Röpke, ao financiar por meio de fundos internacionais o nacional-desenvolvimentismo destes países periféricos na cadeia de produção global, está-se financiando Estados nacionais a dissolverem suas próprias bases culturais e espirituais que o legitimam, e isto é feito de forma totalmente irresponsável. Isto também compromete o próprio desenvolvimento econômico, pois o desenvolvimento forçado não respeita o tempo histórico e sociológico da população, que se verá forçada a se adaptar aos novos modos de vida para os quais não foram preparados, o que certamente distorcerá o processo social que promove o desenvolvimento técnico. Tal situação irá apenas reforçar grupos nacionalistas e socialistas.

O grande êxodo rural promovido pela industrialização veloz promoverá uma movimentação de massas desproporcional, o que encurtará a mão de obra no setor primário. Essa mão de obra é mais barata e menos qualificada, e a levará para os grandes centros urbanos criando enormes favelizações. Como de fato ocorreu no Brasil do regime militar. Ocorreu também (como previsto por Röpke), o encarecimento dos alimentos devido a insuficiência da produção de produtos do setor primário.

Por fim, é incrível como um livro escrito a tanto tempo atrás, por um homem que nasceu na Alemanha e se exilou nos Estados Unidos, é capaz de dizer com antecedência tanto sobre a história do Brasil e dos demais países latino-americanos. Röpke via no mercado livre, a melhor forma de se propiciar desenvolvimento técnico e social para uma nação subdesenvolvida, caberia apenas ao ocidente desenvolvido abrir seus portos aos subdesenvolvidos e vice-versa. Foi justamente isto que levou o comunismo ao colapso, o retorno ao livre-mercado forçou a união soviética a competir com um avanço econômico, social e técnico que era impossível para ela acompanhar devido à sua burocracia gigante, que imobilizava toda a cadeia de produção. Wilhelm Röpke, embora profético, não era nenhum profeta, era um homem que apenas decidiu enxergar o "óbvio ululante" como diria Nelson Rodrigues, "o reaça". Ao invés de fantasiar sobre categorias abstratas ou mendigar atenção com teorias materialistas e superficiais, Röpke buscou compreender a política e a economia sobre as categorias mais fundamentais, a cultura e a tradição, além  da ação humana movida por elas; o fato é que tal capacidade de entendimento da realidade só poderia vir de alguém influenciado por duas das mais importantes escolas de pensamento econômico do século XX, a escola austríaca e a escola de Freiburg.
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RÖPKE, Wilhelm. Os países subdesenvolvidos. São Paulo: Edição Saraiva, 1963.

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